Como determinar se uma lei é justa?
Existem três categorias de elementos constitutivos da realidade, os naturais, os criados pelo ser humano e os mistos.
Os naturais são aqueles que surgem de forma espontânea: os elementos químicos, as três cores gráficas básicas, os pares básicos do DNA, são exemplos de tijolos criados pela natureza para construírem coisas maiores e mais complexas, sendo que estes não podem ser mudados dentro do universo em que vivemos.
Existem também os elementos artificiais, que são aqueles criados pelo ser humano. As letras do alfabeto e as palavras de uma determinada língua são exemplos de convenções humanas que se apoderam de segmentos para criarem realidades mais complexas.
Assim, é errado dizermos que o DNA é escrito pelo “alfabeto da natureza”, uma vez que o código genético vale para qualquer tempo e qualquer lugar e um alfabeto corresponde apenas a uma determinada cultura.
Alguns elementos constitutivos são apenas aparentemente naturais, como acontece com o sistema decimal. Apenas temos a impressão de que cálculos devem ser feitos com a base de dez pelo simples fato de que desenvolvemos tal forma de pensamento devido ao fato de possuirmos dez dedos nas mãos, mas outras culturas desenvolveram, por exemplos, sistemas binários, octais, etc. Os elementos naturais (fato de possuirmos dez dedos) muitas vezes nos levam à falsa ideia de “naturalidade” dos sistemas (sistema decimal), mas devemos sempre ter em mente essas divergências.
Como terceiro grupo, existem os elementos mistos. Um bom exemplo são as notas musicais, que são inventadas pelo ser humano e culturas diferentes criam sistemas diversos, músicas diferentes baseadas em sistemas diversos. No entanto, dentro de um determinado sistema, a sequência de notas deve ser respeitada, sob o risco de gerar desarmonias que todos percebem.
Por elementos mistos, portanto, chamamos aqueles elementos constitutivos da realidade que não podem ser classificados nem como provenientes da natureza do cosmos e nem como frutos da criação humana, mas estão em um patamar intermediário.
Nessa categoria classificam-se os Princípios Fundamentais, tão caros às ciências jurídicas. Não os podemos enquadrar como fato natural e nem como artificialismo, ou seja, como meras criações humanas, mas devemos considerar que, dentro de um determinado sistema cultural, eles são válidos e harmônicos, assim como notas musicais em uma sinfonia.
Onde se quer chegar com isso?
As atuais revoluções nas comunicações, nos transportes e nos costumes estão gerando conflitos entre as culturas. Por um lado, temos uma universalização cultural, que puxa para uma universalização legislativa, e por outro, uma especificação regional que horroriza aos demais: deve-se retirar os clitóris das meninas, ou apedrejar mulheres adúlteras? Ou, mais perto de nosso país, deve-se permitir que indígenas enterrem vivos os bebês nascidos gêmeos? Ou, mais perto ainda de nós, deve-se permitir que o STF escolha qualquer outro direito fundamental em detrimento da liberdade de expressão, que sempre sai perdendo na jurisprudência de nosso país?
Por que aceitamos como naturais a pena de morte em alguns estados americanos ou que os chineses cobrem a bala das famílias dos que são fuzilados? Será que é apenas por algum tipo de fraqueza, ante a possibilidade de interferirmos em potências mundiais? Seria o direito apenas uma manifestação do poder, nada mais do que isso?
Como decidir qual é o valor que deve ser preservado? Existe um método?
Existem, pelo menos, três fundamentos jurídicos: os princípios fundamentais, como a liberdade, a vida, etc.; os bens jurídicos protegidos, como a infância, a saúde, etc.; e as normas programáticas, como integração internacional, erradicação da pobreza, etc.
Qual é o direito superior? Poderíamos argumentar que os princípios sejam “átomos” e os outros dois sejam “moléculas” da realidade jurídica. Ora, mas aço é melhor do que ferro em estado puro, portanto, não podemos admitir que os princípios se sobreponham à combinação deles, dependendo da situação, os bens jurídicos e os programas sociais têm maior valor, pois afirmar o contrário seria o mesmo que dizer que as músicas deveriam ser feitas apenas com notas, desprezando os acordes.
Considerando, portanto, que os princípios atômicos jurídicos formem “moléculas jurídicas”, o que reconhecemos como válido no direito?
Em primeiro lugar, todo o direito válido faz parte de um sistema, ele não pode ser uma regra solta no vácuo. É por este motivo que não reconhecemos os direitos provenientes de sistemas culturais. Um índio amazônico que pratica estupros e depois se refugia na sua taba, não pode alegar que está apenas exercitando uma prática cultural, assim como um religioso não pode negar uma transfusão de sangue ao filho. São apenas práticas consuetudinárias, não representam direitos pelo fato de não terem sido organizadas em sistemas jurídicos.
O segundo aspecto, quando existe uma construção sistemática, como por exemplo nas ditaduras teocráticas, devemos nos perguntar por que não reconhecemos, o apedrejamento de adúlteras como direito legítimo, mas apenas como uma prática bárbara.
Não basta ao direito apenas o aspecto sistemático, mas é preciso também uma construção lógica. O arbítrio não faz parte das regras do jogo, pois o “acorde” sairá destoante se usarmos notas em um instrumento desafinado. Assim, quando uma sociedade obriga a todos os homens usarem barba, não se consegue ver uma lógica, senão a da imposição religiosa, facilmente contestada por qualquer um que pense diferente.
Existe ainda um terceiro fator que faz com que não reconheçamos direitos, que é quando existe um sistema e existe também uma construção lógica, mas mesmo assim não ocorre o justo. O melhor exemplo é o nazismo que possuía um direito com tais características.
Acontece que além de ser sistemático e lógico, o direito é sempre um sistema que tem coerência consigo mesmo, isto é, é preciso que respeite os fundamentos sistêmicos, que são históricos, acordados internacionalmente e baseados nas “notas e acordes” jurídicos, que são os princípios fundamentais, os bens juridicamente protegidos e as normas programáticas. Um sistema jurídico que crie uma ruptura com tudo o que foi estabelecido pela própria sociedade e pelas sociedades do seu entorno simplesmente não é reconhecido.
Assim, o justo deve possuir três características: é sistêmico, como sinônimo de organização formal, é lógico, como antônimo de arbitrário e é lógico-sistêmico, significando que deve seguir a construção que lhe é própria, não admitindo rupturas impostas por um grupo minoritário.
É por isso que admitimos o direito chinês, apesar de exótico para nós ocidentais, e não reconhecemos direitos iranianos. Os chineses apenas têm um sistema diferente, mas têm todas as características que reconhecemos como justo, permitindo que o aceitemos como coerente.
Os naturais são aqueles que surgem de forma espontânea: os elementos químicos, as três cores gráficas básicas, os pares básicos do DNA, são exemplos de tijolos criados pela natureza para construírem coisas maiores e mais complexas, sendo que estes não podem ser mudados dentro do universo em que vivemos.
Existem também os elementos artificiais, que são aqueles criados pelo ser humano. As letras do alfabeto e as palavras de uma determinada língua são exemplos de convenções humanas que se apoderam de segmentos para criarem realidades mais complexas.
Assim, é errado dizermos que o DNA é escrito pelo “alfabeto da natureza”, uma vez que o código genético vale para qualquer tempo e qualquer lugar e um alfabeto corresponde apenas a uma determinada cultura.
Alguns elementos constitutivos são apenas aparentemente naturais, como acontece com o sistema decimal. Apenas temos a impressão de que cálculos devem ser feitos com a base de dez pelo simples fato de que desenvolvemos tal forma de pensamento devido ao fato de possuirmos dez dedos nas mãos, mas outras culturas desenvolveram, por exemplos, sistemas binários, octais, etc. Os elementos naturais (fato de possuirmos dez dedos) muitas vezes nos levam à falsa ideia de “naturalidade” dos sistemas (sistema decimal), mas devemos sempre ter em mente essas divergências.
Como terceiro grupo, existem os elementos mistos. Um bom exemplo são as notas musicais, que são inventadas pelo ser humano e culturas diferentes criam sistemas diversos, músicas diferentes baseadas em sistemas diversos. No entanto, dentro de um determinado sistema, a sequência de notas deve ser respeitada, sob o risco de gerar desarmonias que todos percebem.
Por elementos mistos, portanto, chamamos aqueles elementos constitutivos da realidade que não podem ser classificados nem como provenientes da natureza do cosmos e nem como frutos da criação humana, mas estão em um patamar intermediário.
Nessa categoria classificam-se os Princípios Fundamentais, tão caros às ciências jurídicas. Não os podemos enquadrar como fato natural e nem como artificialismo, ou seja, como meras criações humanas, mas devemos considerar que, dentro de um determinado sistema cultural, eles são válidos e harmônicos, assim como notas musicais em uma sinfonia.
Onde se quer chegar com isso?
As atuais revoluções nas comunicações, nos transportes e nos costumes estão gerando conflitos entre as culturas. Por um lado, temos uma universalização cultural, que puxa para uma universalização legislativa, e por outro, uma especificação regional que horroriza aos demais: deve-se retirar os clitóris das meninas, ou apedrejar mulheres adúlteras? Ou, mais perto de nosso país, deve-se permitir que indígenas enterrem vivos os bebês nascidos gêmeos? Ou, mais perto ainda de nós, deve-se permitir que o STF escolha qualquer outro direito fundamental em detrimento da liberdade de expressão, que sempre sai perdendo na jurisprudência de nosso país?
Por que aceitamos como naturais a pena de morte em alguns estados americanos ou que os chineses cobrem a bala das famílias dos que são fuzilados? Será que é apenas por algum tipo de fraqueza, ante a possibilidade de interferirmos em potências mundiais? Seria o direito apenas uma manifestação do poder, nada mais do que isso?
Como decidir qual é o valor que deve ser preservado? Existe um método?
Existem, pelo menos, três fundamentos jurídicos: os princípios fundamentais, como a liberdade, a vida, etc.; os bens jurídicos protegidos, como a infância, a saúde, etc.; e as normas programáticas, como integração internacional, erradicação da pobreza, etc.
Qual é o direito superior? Poderíamos argumentar que os princípios sejam “átomos” e os outros dois sejam “moléculas” da realidade jurídica. Ora, mas aço é melhor do que ferro em estado puro, portanto, não podemos admitir que os princípios se sobreponham à combinação deles, dependendo da situação, os bens jurídicos e os programas sociais têm maior valor, pois afirmar o contrário seria o mesmo que dizer que as músicas deveriam ser feitas apenas com notas, desprezando os acordes.
Considerando, portanto, que os princípios atômicos jurídicos formem “moléculas jurídicas”, o que reconhecemos como válido no direito?
Em primeiro lugar, todo o direito válido faz parte de um sistema, ele não pode ser uma regra solta no vácuo. É por este motivo que não reconhecemos os direitos provenientes de sistemas culturais. Um índio amazônico que pratica estupros e depois se refugia na sua taba, não pode alegar que está apenas exercitando uma prática cultural, assim como um religioso não pode negar uma transfusão de sangue ao filho. São apenas práticas consuetudinárias, não representam direitos pelo fato de não terem sido organizadas em sistemas jurídicos.
O segundo aspecto, quando existe uma construção sistemática, como por exemplo nas ditaduras teocráticas, devemos nos perguntar por que não reconhecemos, o apedrejamento de adúlteras como direito legítimo, mas apenas como uma prática bárbara.
Não basta ao direito apenas o aspecto sistemático, mas é preciso também uma construção lógica. O arbítrio não faz parte das regras do jogo, pois o “acorde” sairá destoante se usarmos notas em um instrumento desafinado. Assim, quando uma sociedade obriga a todos os homens usarem barba, não se consegue ver uma lógica, senão a da imposição religiosa, facilmente contestada por qualquer um que pense diferente.
Existe ainda um terceiro fator que faz com que não reconheçamos direitos, que é quando existe um sistema e existe também uma construção lógica, mas mesmo assim não ocorre o justo. O melhor exemplo é o nazismo que possuía um direito com tais características.
Acontece que além de ser sistemático e lógico, o direito é sempre um sistema que tem coerência consigo mesmo, isto é, é preciso que respeite os fundamentos sistêmicos, que são históricos, acordados internacionalmente e baseados nas “notas e acordes” jurídicos, que são os princípios fundamentais, os bens juridicamente protegidos e as normas programáticas. Um sistema jurídico que crie uma ruptura com tudo o que foi estabelecido pela própria sociedade e pelas sociedades do seu entorno simplesmente não é reconhecido.
Assim, o justo deve possuir três características: é sistêmico, como sinônimo de organização formal, é lógico, como antônimo de arbitrário e é lógico-sistêmico, significando que deve seguir a construção que lhe é própria, não admitindo rupturas impostas por um grupo minoritário.
É por isso que admitimos o direito chinês, apesar de exótico para nós ocidentais, e não reconhecemos direitos iranianos. Os chineses apenas têm um sistema diferente, mas têm todas as características que reconhecemos como justo, permitindo que o aceitemos como coerente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário