sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Romance Ferroviário

Subi no trem na estação Armênia e num lance de olhos percebi que havia um lugar vago no final do corredor, onde fica a cabine do maquinista. Não era uma hora de grande movimento no metrô e haviam outros lugares vagos, mas aquele em especial me atraiu por causa das companhias: charme em dose dupla, gatas a granel sentadas no banco perpendicular ao meu.
A porta fechou-se e o vagão entrou no seu túnel iluminado por lâmpadas de mercúrio. Olhei com o canto do olho e percebi que eu despertara um certo interesse, afinal naquela manhã eu havia ido visitar alguns clientes do escritório e colocara um dos meus melhores ternos, minha auto-imagem, poderia-se dizer, não era das piores.
A que estava sentada no corredor, olhei como quem não quer nada, era uma beldade de 'jeans' e jaqueta de couro, cabelos negros com um cacheado natural, lábios graúdos e olhos inquietos. Tinha apenas um defeito: não parecia perceber que eu existia. A outra, ao contrário, não era a oitava maravilha do mundo, mas também não era feia. Era loira e tinha o lábio inferior meio beiçudo e caído o que lhe dava uma expressão pateta, mas atraente. Vestia-se muito bem, devia ser uma executiva, uma médica ou qualquer coisa assim. E o melhor de tudo é que enquanto distraía-se olhando pela janela e para as pessoas, de vez em quando olhava para mim, dando uma paradinha que não deixava dúvidas sobre o interesse.
Enquanto o trem parava na estação São Bento, arrisquei um sorriso e ela imediatamente virou a cabeça para a janela aparentando indignação. Muito rápido, pensei, me achei um imbecil troglodita. Achei que tinha que ser mais sutil, mas não, era só um jogo da parte dela, uma performance teatral onde eu era o único espectador e ela a única artista. Voltou a olhar e, para a minha surpresa, retribuiu o sorriso. Soou um apito, as portas fecharam-se e penetramos novamente no túnel cintilante. Um outro trem que vinha no sentido oposto, passou por nós rapidamente e assim que o ruído parou, resolvi puxar conversa, mas fiquei paralisado de espanto.
Deixei de ser indiferente para a deusa morena ao lado, mas por um motivo muito especial. Flagrei-a acabando de retirar a carteira da bolsa da minha paquera e escondendo na sua jaqueta.
Eu juro que eu ia fazer alguma coisa, mesmo porque seria uma aproximação fácil denunciar um roubo, fazer um escândalo e depois consolar a vítima e etecetera, mas não sei porque eu não fiz. Acho que foi porque a bela agiu antes da fera aqui: deu uma piscada e meneou a cabeça, convidando para descer na próxima estação. Acabei por ficar brincando de pombo apaixonado com a vítima que depois prosseguiu viagem.
Pulamos na estação Vergueiro, o trem partiu e ela ficou muito agradecida. Depois tivemos um almoço e uma tarde maravilhosa juntos, mas eu, por via das dúvidas, sempre de olho na minha carteira.






quarta-feira, 26 de setembro de 2007

Histórias Bizarras (5)


Eu e um amigo começamos a descida do Pico da Bandeira, na divisa entre Minas e Espírito Santo as 5 da tarde. São seis horas de caminhada por uma estrada de terra até a cidadezinha de Alto Caparaó. Estávamos confiantes em uma pequena lanterna, mas uma hora depois de anoitecer completamente a lâmpada queimou. A noite estava tão escura no Parque Nacional do Alto Caparaó que tínhamos de caminhar olhando para cima, pois não conseguíamos ver o caminho. Para sabermos que estávamos no meio da estrada, víamos a copa das árvores que havia nos dois lados se fechando sobre nós. No meio, víamos a faixa de estrelas e percebemos que podíamos caminhar muito bem apenas ficando sob a linha de encontro das duas copas. Funcionou muito bem, por incrível que pareça, em várias horas de caminhada no escuro. nenhum de nós dois sequer tropeçou.
Eu caminhava na frente e meu amigo atrás. Lá pelas tantas, na distância de um braço esticado, vi um homem baixinho e gordinho, 1,30m mais ou menos, com imensos olhos e usando um chapéu coco parado no meu caminho.
Em desenho animado, para indicar que os personagens estão apavorados, os cabelos da cabeça se arrepiam. Foi exatamente isso que aconteceu, senti meus cabelos se arrepiarem! Dei alguns passos para trás e perguntei ao meu amigo o que seria aquilo. Resolvemos contornar, nos afastamos uns dois metros para o canto da estrada e ultrapassamos aquele obstáculo assustador. Ouvimos ruídos de um animal caminhando e se afastando lentamente e chegamos à conclusão que deveria ser um terneiro desgarrado, um cavalo ou algum outro animal e que na escuridão a nossa mente cansada de um dia inteiro de caminhada criou uma imagem esquisita. Pode ter sido uma onça e levamos uma sorte danada de ela não nos atacar, mas é uma suposição que nunca vou confirmar.
Tudo teria ficado como um incidente cômico se alguns anos depois eu não tivesse feito amizade com um senhor do Centro-Oeste que tinha sido caminhoneiro e participado de um número sem-fim de pescarias no Pantanal mato-grossense e na Amazônia. Contei essa história para ele e ele sem vacilar falou: “- Ah, é o Rei-do-Mato!”. “- O quê?”, perguntei. “- O Rei-do-Mato, bem isso que você falou: um sujeito baixinho, de chapéu e de olhos grandes que vive no meio do mato. Sorte vocês não mexerem com ele senão teriam levado uma surra de entortar!”
Interessante. Eu vi uma figura do folclore brasileiro! Parece que mais gente se encontrou com uma vaca no escuro e criou imagens na sua cabeça...

Vi o Boitatá também.
Estava viajando de ônibus à noite, na BR116, se não me falha a memória no trecho de Santa Catarina. Perdi o sono lá por uma, duas da manhã e abri um pouco a cortina. De repente, ao lado da estrada vi uma luz verde, do mesmo tom de interruptores domésticos de luz fluorescentes. Era muito forte, como se um poste de luz estivesse aceso e no centro desta luz havia uma rês morta. Algum tipo de reação química havia feito o bicho brilhar no escuro. O ônibus prosseguiu e infelizmente não consegui ver detalhes, mas a luz se espalhava em um círculo de uns 50 cm para fora do animal.
Algum tempo depois li em algum lugar que se trata de um fenômeno natural, fungos fluorescentes ou qualquer coisa parecida, mas que deu origem à lenda do Boitatá.

terça-feira, 25 de setembro de 2007

Quem partiu? Quem ficou?

Uma frase do século XVIII que sempre é muito repetida e modernizada através dos séculos é a de “Quem não foi comunista aos dezoito anos, não tem coração. Quem continua sendo depois dos trinta, não tem cabeça”. Eu diria melhor, muitos comunistas depois dos trinta, não têm é bom coração.
Eu tive o privilégio de viver em uma época em que caiu o Muro de Berlim. Antes disso, eu vi, ninguém me contou, colegas de faculdade afirmando que a Romênia era o paraíso na terra e brigando com aqueles que achavam que Cuba é que o era... Naquela época, quando alguém falava no socialismo escandinavo, se torcia o nariz para aqueles porcos capitalistas sob o sol da meia-noite.... aliás, engraçado, hoje são países-modelo para todo aquele que de alguma forma quer extorquir dinheiro do estado.
Diz-se que na história da arte só existe um critério para sabermos quem é bom e quem não é. O crivo do tempo.
Quem diria que os filmes de Goddard iriam ser esquecidos? Poetas cubanos? Cinema do leste europeu? Alguns esquerdinhas brasileiros, muitos dos quais continuam até hoje tentando criar um estado-monstro, quem diria, eram uns merdas: a justiça da história fará com que caiam num retributivo esquecimento e que passem pela vida com o maior dos disabores, que é o de passar pelo tempo como se nunca tivessem existido. Muralistas mexicanos? Quem diria que Frida viria a ser mais famosa do que Rivera (ao meu ver, injustamente, diga-se de passagem)?
À época, todos pareciam expressões de Deus na terra, de tanto que eram idolatrados. Era uma seleção artificial promovida pelos líderes soviéticos: quem fosse de esquerda recebia verbas e promoção, quem atacava aquelas idéias, era duramente criticado.
E Bertold Brecht, até Brecht, quem diria? Está lenta e constantemente rumando ao ostracismo do tempo. Antes se via uma Mãe Coragem na primeira esquina e uma Senhora Carrar na próxima. Qual jovem teatreiro ainda monta Brecht?
Quem ficou eterno daquela época? Ezra Pound? T.S.Elliot? O carioquíssimo Nélson Rodrigues? Truffaut? John Ford? Elvis? Ficaram mais direitões, reacionários, simpatizantes do facismo, carolas e afins do que os pseudo-magnânimos e auto- intitulados ilustres, comunistas. Por quê?
Porque estavam errados. Foram datados. Comprados e manipulados. Só por isso. Os que estão ainda aí são os esqueletos de armário daquela época e que fatalmente irão se apagar um a um.
Uma nova geração virá e tomará o lugar que lhes é de direito, uma geração que não rasgou sutiãs, nem teve pais que lutaram contra Hitler e nem viu o mundo dividido em dois. Logo esse dia chegará e os ventos do esquecimento soprarão cada vez mais fortes.

segunda-feira, 24 de setembro de 2007

Cine-Theatro Ypiranga

Conta-se que quando os primeiros filmes chegaram no interior da Rússia, as pessoas não compreendiam os enredos porque não conseguiam enxergar as pessoas “cortadas” ao meio. Os plano e os closes, por mais óbvios que nos possam parecer hoje, fazem parte de uma linguagem que precisa se aprendida. Meu pai contava da época em que estreiou “Cidadão Kane” em Porto Alegre. Ninguém entendia, havia profundas discussões sobre o que seria “Rosebud”. De novo: por mais óbvio que nos possa parecer hoje em dia, o filme foi um fracasso local: latas de película foram jogadas no lixo, em frente aos cinemas.
Mas não é da magia dos filmes que eu quero falar aqui, e sim das salas de exibição com as quais me parece ter acontecido o inverso, as novas gerações não compreendem a linguagem própria que existia em ver um filme em coletividade.
Na quadra da minha casa, havia até os anos setenta o Cine-Theatro Ypiranga que passava filmes de aventuras: faroestes, capa-e-espada, comédias do Mazaroppi, etc.
Nos domingos, o programa das famílias dos arredores era assistir à sessão vespertina dupla, isto é se pagava um ingresso para ver dois filmes. Antes das duas horas, já estávamos todos, colegas de colégio e outros moleques da vizinhança sentados nas primeiras filas enquanto as nossas mães zelosas se sentavam nos bancos mais de trás conversando, pois no cinema todos se conheciam. Passava o baleiro, carregando um tabuleiro preso ao pescoço e se comprava uma caixa de Bonzinhos (umas bolinhas de chocolate crocante que vinham numa caixinha amarela) ou balas de goma Americana. Todos chegávamos uma meia hora antes, só pela farra.
Antes de haver aquelas luzinhas no chão, havia o Lanterninha, funcionário do cinema que portava uma lanterna para indicar o assento para os que chegavam atrasados, mas que também continha a bagunça das turminhas e os avanços dos namorados mais ousados com sua inesperada luz inquisitorial. Nas tardes quentes de verão, os postigos de umas vinte janelas nas paredes laterais eram abertos, pois não havia ar condicionado. Quando o lanterninha fechava as janelas, era sinal de que o filme iria começar...
Propagandas. Certificado de censura do filme a seguir. Trailer. Mais trailer. Canal Cem, um documentário futebolístico com suas imagens gigantes e sensacionais. Até que em um momento aparecia o certificado de censura do filme que tínhamos vindo assistir: gritos e bagunça. Se aparecesse um condor, se fazia xô, xô! Se aparecesse o leão da Metro, se fazia shh! Shh!
Ali eu assisti a primeira versão de Missão Marte no qual o mocinho morria no final para salvar os outros astronautas. Foi a primeira vez que eu percebi que cinema também fazia chorar.
O melhor de tudo era quando arrebentava o filme! Todo mundo no escuro, fazendo gritaria. Assim que a luz voltava (ou o lanterninha apontasse seu facho), baixava um silencio imediato...
E quando terminava o filme, só havia ido a metade da brincadeira. Íamos para casa tomar um café da tarde rápido e voltávamos antes de começar a segunda sessão.
Ao crescer um pouco, a nossa turma já tinha permissão para caminhar um pouco mais e íamos ao Cine Colombo, há umas 10 quadras de distância. Ao crescermos mais um pouco, fizemos umas carteiras de estudante com data de nascimento falsas para ver filmes para maiores e, no Cine Rosário, assistimos a clássicos do cinema nacional como “O Homem de Itu” e “A Estudante que Levou Pau”. Anos mais tarde, fui muito mais longe e vi até um cinema ao ar livre, como aquele do filme “O Paciente Inglês”, no interior do Paraguai. Sim. Tudo isso existiu: eu vi!
Acho que o divisor de águas, que matou o cinema não foi o advento do vídeo-cassete e nem a violência, como muito se apregoa, mas o pornô-intelectual. Quem assiste a “O Império dos Sentidos” ou aos filmes do Pasolini, sai de foco. A partir daí valia mais o que estava sendo dito e não a emoção de compartilhar bons momentos. Cinema, no sentido de película, foi ganhando mais expressão do que cinema, no sentido de local.
Filmes são até legais, mas cinemas... ah, só quem esteve por lá é que viu.
Os anos se passaram, o Cine-Theatro Ypiranga foi casa noturna, bar, igreja evangélica, e hoje voltou a ter o mesmo nome de outrora, mas é uma discoteca. O prédio, felizmente, está tombado pelo patrimônio histórico. A alma se foi, mas a casca, pelo menos, ainda está por lá, abrigando dulcíssimos fantasmas de minha infância.

domingo, 23 de setembro de 2007

Do Amor

Quero sentir o cheiro
Da folha do limoeiro,
Quero sentir o gosto
Do suor no teu rosto
E escutar o som
Vibrante em teu coração,
Quero sentir o calor, a cor e o frescor
Do amor.
Quero sentir a energia
Que amanhece com cada dia,
Quero sentir a vida
Latente, nunca esquecida,
Quero sentir o momento
Fruindo em terno lamento,
Fluindo ao sopro do vento,
Quero sentir o odor da flor do amor.
Quero sentir o calor, a cor e o frescor
Do amor.
Quero sentir o odor da flor do amor.

Crocodilos

Esta foto, tirei em um condomínio residencial na Flórida. Os prédios podem ser vistos ao lado. Por ali, passam mães com carrinhos de bebê e crianças brincam nos gramados.
Na placa diz, "Proibido Nadar - É Ilegal Alimentar os Crocodilos".
E depois os americanos acham que o Brasil é que é um país selvagem...

sexta-feira, 21 de setembro de 2007

Sonho de 24/09/1994


O que me impressionou naquela cidadela foi o cemitério no qual as pessoas que ali morreram tinham os seus túmulos de acordo com as suas mortes, por exemplo, uma cozinheira que tinha morrido na cozinha tinha panelas e fogão arrumados como em uma vitrine. Um suicida que tinha se afogado no mar, tinha o túmulo coberto por algas e assim por diante. Uma outra coisa impressionante, os túmulos tinham estátuas das pessoas mortas, mas alguém tinha quebrado partes dos rostos.
Eu e minha (ex) mulher éramos os únicos moradores que haviam se mudado para ali depois que a cidade ficou deserta. Ela queria paz e tranqüilidade, mas quando fiquei sabendo que aquelas pessoas não tinham saído dali por livre e espontânea vontade, mas porque foram assassinadas, fiquei com medo e tentei fugir.
A cidade tinha um saguão de entrada que era como um enorme salão de baile ou um cinema abandonado e ele estava todo escuro, mesmo sendo dia, quando passei por ali, porque as janelas estavam fechadas. Fui me dirigindo à porta de saída e uma enorme massa me atacou. Fiquei apavorado porque acreditei ser uma assombração, mas não, consegui me evadir e fugi de volta à cidade. Consegui ver que não era assombração alguma, mas sim uma elefanta que estava ali com o seu filhote e atacava os passantes para o proteger.
Fui até um andar superior deste prédio onde ficava o saguão de entrada e gritei para as pessoas que passavam na rua abaixo, só que era incrivelmente alto e ninguém ouvia para nos ajudar.

quinta-feira, 20 de setembro de 2007

Anjo da Morte

Museu da Memória Nacional? Vergonha nacional!
Como podiam ser tão estúpidos? Colocarem bem na marquise a primeira câmera da Companhia Ática Cinematográfica. Foi a câmera que filmou toda uma história do cinema nacional, desde os primórdios, os filmes mudos de Roberto Marcos até a visita da Grace Kelly aos estúdios! E agora estava ali... Sem uma placa indicativa da importância que teve. Num tripé de concreto, sujeita ao sol, ao granizo e aos cocôs de passarinho.
Eu precisava fazer alguma coisa e era urgente, antes da primeira chuva. Os jovens cinéfilos como eu não podiam admitir um tesouro cultural exposto daquela forma. Pedir providências urgentes, mas para quem? Em um telefonema anônimo reclamando da situação para o museu de nada adiantou, pois o diretor garantiu que o arquiteto sabia o que estava fazendo e que a câmera estaria em perfeito estado de conservação. O que os arquitetos sabem do cinema nacional? Será que ele sabia que as presilhas de fixação da lente eram feitas de bronze e sem uma conservação perfeita elas ficam verdes, corroem-se e em poucos anos as lentes cairiam no chão? E será que ele notou os autógrafos de todos os atores que participaram do filme "O Anjo da Morte". Não, é claro que não, escritos no tempo da caneta-tinteiro, já deviam estar bem apagados, só quem sabia é que poderia notar...
Planejei tudo para a manhã seguinte. Deixar aquela preciosidade mais uma noite sujeita ao orvalho não me agradava muito, mas cedinho não passava ninguém na rua e era a melhor hora de roubar.
Fui com todo o cuidado. Subir na marquise não foi muito difícil. Difícil foi tirar a câmera do pedestal. Os ignorantes tinham aparafusado dentro do tripé de concreto, tive que deixar o suporte lá e tirar só a parte de cima que na verdade era o que interessava. Até aí deu tudo conforme o planejado, só o que eu não contava era com o peso destas câmeras antigas. Como é que eu iria descer e carregar a câmera ao mesmo tempo. E ainda sem ninguém me ver? Já estava no lusco-fusco do dia e dali a pouco começaria o movimento na rua, o vigia poderia sair e dar uma olhada na marquise e aí como é que ficaria?
Não tive muito tempo para pensar essas coisas, ouvi gritos vindos da rua. Pegaram-me, pensei. Um cara baixinho passou na calçada e ficou apontando para cima. Na hora não soube como ele me viu, pois eu estava bem escondido atrás da câmera. Fui até a ponta da marquise falar com ele, para ver se tinha chance de me safar, mas não, ele continuou gritando, chamando a atenção e apontando para cima. As janelas dos moradores da redondeza começaram a se abrir e eu fiquei apavorado. Deu vontade de me atirar no pescoço daquele sujeito, será que ele não viu que eu estava fazendo um bem?
Surpresa! Não era para mim que ele estava apontando. No alto do prédio do museu estava um sujeito de terno preto caminhando no peitoril. Um louco, provavelmente. Será que ele ia saltar? Quanto a ele, eu não sei, mas eu coloquei a câmera no tripé, agarrei a borda da marquise, saltei no chão e fiquei olhando para cima como a pequena multidão de pijamas que se aproximava.
O homem parou na quina do prédio, levantou os braços ao céu e ficou lá, olhando com a cabeça para cima como se estivesse rezando, não dava para ouvir o que ele falava, pois ele estava no alto do prédio. Saltou, para o susto de todos, saltou como um mergulhador na piscina, sem expressão de dor ou sofrimento, mais parecia estar fazendo algo grandioso. Caiu, caiu. Quatro andares, mas não foi até o chão, ficou flutuando a alguns centímetros, bem abaixo da câmera sob a marquise em que eu estava antes. O susto foi maior ainda.
"Eu sou o Anjo da Morte", falou, "eu vim para encontrar a única alma boa escolhida pelo Senhor e depois destruir esta cidade".
Pânico geral!
Eu havia visto o filme. Era um dos meus favoritos, grandes atores, mas o protagonista parecia mais um canastrão perto do Anjo da Morte verdadeiro. Os olhos dele eram vermelhos. Dava para ver que não era maquilagem. Ele não tinha asas como as do Antônio Goulart, que fez o papel do Anjo e que no fim se apaixonou pela Maria José, a vendedora de flores representada pela Raquel de Medeiros. Não, não. Este Anjo da Morte não parecia dobrar-se a paixões. Ele parecia estar decidido a cumprir a sua missão. Como eu sabia que não havia lugar para onde correr, fui o único a ficar parado, olhando tudo e esperando ele cuspir o fogo e o enxofre.
Fiquei apavorado quando ele veio falar comigo. Olhou nos meus olhos e perguntou naquela sua voz sepulcral:
"Você tem fogo?"
Eu não entendi muito bem. Como assim, fogo? O próprio Anjo da Morte, não tem fogo? Que negócio de destruidor de araque é esse? Mas não, eu não tinha fogo, mesmo, eu não fumava ainda naquela época.
"Diabos!", ele falou. "Com esses cortes do orçamento cortaram até as verbas da chama-piloto. E agora, como é que eu vou destruir esses pecadores?"
E eu que nem sabia que precisava de chama-piloto, essas coisas a gente sempre pensa que é mágica, não imagina a tecnologia que tem por trás. Ele continuou:
"Está decidido! A morte virá pelo vento. Um furacão nunca dantes visto, varrerá a iniqüidade do mundo."
Acho que ele até esqueceu de salvar a alma boa que veio buscar porque assim que ele falou isso o vento começou a aumentar. E a aumentar. E ele ali, parado, flutuando no ar.
Aquela ventania toda mexeu com a câmera que eu tinha deixado só apoiada. Só sei que lá pelas tantas aquele trambolho despencou lá de cima, bem na cabeça do Anjo e o Anjo da Morte, morreu. Virou fumacinha e ficaram no chão só as cinzas que logo foram levadas pelo vento e que depois também foi acalmando aos poucos.
Olhei para os lados. Ninguém nas ruas. Peguei a câmera e caminhei até em casa em plena luz do dia. Ninguém viu.
As histórias dessa câmera eu vou contar até pros meus netos!

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

Histórias Bizarras (4)

Minha amiga M. estava almoçando com a família de sua irmã em uma casa que haviam alugado em Bombinhas, SC. De uma hora para outra, um copo na pia simplesmente se estilhaçou sozinho. Não havia ninguém a menos de dois metros, não havia ocorrido nenhuma mudança de temperatura, nenhum projétil, nada. O copo simplesmente estourou sozinho. A irmã de M. contou que não era a primeira vez que fenômenos como aquele aconteciam e que aquele não havia sido o mais violento. Ela acreditava serem causados pela filha ainda criança. Uma vez aconteceu da tampa de um fogão à gás se levantar e entortar sozinha.
Aliás, esse não foi o único relato que M. já me contou de coisas que explodem. Há muitos anos, meu irmão que é geólogo mandou lapidar várias pedras semi-preciosas, citrinos e ametistas, bonitas mas sem valor. Fiquei alguns anos com elas, depois resolvi distribuir para vários dos meus amigos. M. guardou por vários anos a dela na prateleira da sala, até que um belo dia começou a pensar em se desfazer da pedra. No dia seguinte a esses pensamentos, estava trabalhando e recebeu um telefonema do marido. Ele estava na cozinha e de repente ouviu um barulho na sala: sem mais nem menos, a ametista havia explodido em vários pedacinhos... coincidente, bem na época em que começou a atrapalhar a decoração.

Existe vida após a morte? Milhares de relatos de pessoas que passaram por experiências de quase-morte afirmam que sim, mas como diferenciar uma experiência mística de uma alucinação? Pesquisadores inventaram um método: colocar um monitor de computador virado para cima das mesas de cirurgia, com imagens aleatórias o tempo todo, animais, pessoas famosas, plantas, lugares, etc., de modo que ninguém pudesse saber qual imagem iria aparecer em que momento. Se o quase-defunto pudesse sair do corpo e realmente flutuar sobre a sala de cirurgia, certamente seria o único que saberia o que estava sendo mostrado na tela naquele momento. Bastaria checar o programa para verificar se ele disse a verdade.
Como as pessoas gostam de valorizar o bizarro e nunca vi o resultado desta experiência divulgado pela imprensa, suponho que deu errado: é só alucinação mesmo. Tudo indica que morrer é como tomar uma anestesia geral, simplesmente apagamos para uma longa noite, eterna e sem sonhos.
Os concienciologistas e projeciologistas juram que visitam outros mundos paralelos quando dormem, mas até onde podemos provar?
Que existe algo mais entre o céu e a terra do que sonha nossa vã filosofia, isso existe.

terça-feira, 18 de setembro de 2007

A Evolução das Espécies

Uma coisa que acho incrível na estupidez humana é que depois de mais de 150 anos que Darwin-Wallace descobriram a evolução das espécies, existe muita gente que ainda não acredita. Muitas vezes se critica o fanatismo religioso dos educadores norte-americanos, mas essa descrença atinge a nós, aqui no Brasil também.
Em primeiro lugar, ninguém duvida de uma evolução artificial. Quando um fazendeiro aprimora o seu rebanho cruzando os melhores touros com as vacas mais selecionadas, ninguém acha que ele está fazendo um ato contra Deus ou buscando resultados impossíveis. É claro que funciona e é uma atitude benéfica.
Deve-se lembrar também que a evolução natural não é uma teoria. Na década de 1990, um casal de pesquisadores, coincidentemente nas ilhas Galápagos, percebeu que em uma espécie de pardais sobreviveram apenas os que tinham bicos mais longos, pois conseguiam beber água mais profundamente nos troncos das árvores, o que se tornou determinante em um período de longa estiagem que ocorreu naquele ano. Com isso, não só foi provado que existe de fato evolução natural mas também que ela pode ocorrer em períodos extremamente curtos.
É só olhar com atenção na foto do topo que podemos perceber como o cavalo evoluiu de um animalzinho do tamanho de um cão para o que temos hoje. Está lá, no Museu de História Natural de Nova York para quem quiser ver.
Na própria bíblia, quando Deus ordena à serpente que ela passará a andar sobre o ventre, supõe que ela andava de outra maneira, ou seja, animais evoluem!
Isso tudo pode até ser aceito quando se refere a animais, mas parece que quando se trata do ser humano, a coisa muda de figura.
Quando chegaremos a um máximo recorde olímpico? Nunca, pois a espécie humana evolui lenta e constantemente. Ficaremos indefinidamente mais fortes e rápidos. Crescemos? Sim. Basta ver a foto acima, da sala de armas do museu Metropolitan de Nova York: as armaduras pareciam pertencer às crianças. Os guerreiros medievais eram ridiculamente baixinhos. 600 anos? Visite Ouro Preto, Olinda ou algum forte do nosso litoral que perceberá que as soleiras das portas e as camas dos oficiais eram curtas demais há apenas 300 anos.
Ficamos mais bonitos? Sim. Basta olhar o padrão de beleza dos quadros do século XV. Só gente feia!
Pessoas mais altas e mais bonitas têm mais chances de conseguir parceiros e transmitir os seus genes. Simples assim, mas quem não prefere acreditar na asneira de que todos têm as mesmas oportunidades? Politicamente correto, é cômodo acreditar em um mundo estático, mas é um pensamento extremamente estúpido.
Uma curiosidade: por que de um país pequeno, como o Quênia, saíram tantos grandes corredores de maratona? Pesquisadores afirmam que antigamente era comum o roubo de gado das outras tribos. Assim, aquele que conseguia correr mais era mais bem sucedido e poderia ter mais esposas, gerando mais filhos e transmitindo os seus genes de velocidade às próximas gerações.
O ser humano está em lenta e constante evolução, como em todas as espécies. Milhares de exemplos comprovam isso, é fácil de ver e de comprovar, mas como é difícil de convencer as pessoas do óbvio.

segunda-feira, 17 de setembro de 2007

Momentos Históricos


Para o resto do mundo, quem inventou o avião foram os irmãos Wright, na Carolina do Sul, em 1903, mas para os brasileiros, foi Santos Dumont com seu vôo de galinha no 14 Bis, três anos depois - e não tem santo que convença os nossos historiadores do contrário. Muito bem, da mesma forma o rádio foi inventado por Marconi, mas no Rio Grande do Sul, por mais um desses segredos regionais, todos sabem que foi o padre Landell de Moura.
Verdades históricas postas à parte, meu pai contava uma história desse padre. Quando faleceu o ator de cinema mudo Rodolfo Valentino, as suas fãs em Porto Alegre resolveram mandar rezar uma missa pelo galã e os estudantes, sabendo de tão ridícula atitude, combinaram esperar na frente da igreja para uma grande vaia às moçoilas. Sabendo disso, elas pediram para o padre, Landell, interceder. Solícito, ele encaminhou aquelas tietes dos loucos anos 20 para os fundos da igreja, mas enquanto elas saiam, ele correu à frente para informar aos manifestantes para se apressarem, pois suas vítimas estavam tentando sair por trás...
Quando estamos presenciando o desenrolar da história muitas vezes não nos damos conta da importância do momento. Quantas vezes cruzei com Mário Quintana pela rua? Assisti ao show do Legião Urbana quando recém estavam começando a se tornar famosos, em um clube de bairro e ninguém sabia quem era aquele tal de Renato Russo.
De novo o meu pai: certa vez minhas primas, meninas ainda, acompanharam ele ao aeroporto, na esperança de conseguir um autógrafo de alguém famoso. Enquanto esperava pelo embarque, ele apontou para um senhor que elas não conheciam e mandou elas conversarem com ele. Era Luís Carlos Prestes que logo depois daquilo ficou um tempão no exílio. Aliás, eu próprio o vi uma vez em Porto Alegre pouco antes de morrer. Na hora a gente não percebe que determinadas pessoas e fatos irão desaparecer nas brumas do passado e se tornar míticas.
Na noite do 11 de setembro de 2001, eu estava em um hotel na Flórida. Alguns hóspedes e empregados se reuniram em uma sala com TV para assistirem ao pronunciamento do presidente Bush sobre os ataques daquela manhã. Como eu tinha amizade com o consierge, um americano de Ohio, eu comentei com ele que naquela cidade estaríamos todos seguros, pois quem iria fazer um atentado terrorista contra uma praia, recanto de turistas e aposentados? Em menos de uma semana, foi descoberto que os terroristas do World Trade Center moravam a poucas quadras daquele hotel. Menos de um mês depois, surgiram os ataques com Antrax a dez minutos de distância de onde falei que me sentia seguro. No calor do momento, como iria imaginar?
Pequenos fatos e pessoas que nos passam despercebidos podem se tornar determinantes dos acontecimentos futuros. A importância devida, só o tempo dará.

domingo, 16 de setembro de 2007

Sono ao Relento

Vejo passar a noite estrelada
À bordo da minha nave espacial:
A cadeira preguiçosa e nave-mãe terra.

No eterno não tão eterno
Cintilar do pontilhar de luzes
Possa o caos, tudo e nada
E chega o sono.
Necessário.
O sono que está para o sonho
Como a morte está para a vida
No destino já redigido
Ainda por corrigir.


Vida vicária a ficar.

Ipês


sexta-feira, 14 de setembro de 2007

O Detector de Mentiras


Ainda que estas não sejam idéias minhas, eu as resumi em uma pequena lista para se analisar os argumentos apresentados em qualquer discussão e perceber onde estão as falhas. Este é um pequeno detector de mentiras que deve sempre ser usado para verificar a veracidade dos fatos.
Se é verdade mesmo...- Existe confirmação dos fatos?- Houve uma discussão ampla sobre o fato ou apenas afirmações de um grupo?- Alguém de poder e autoridade está tentando impor o fato?- Quais são as explicações alternativas e por que elas não são válidas?- Estamos aceitando o fato apenas por sermos parte interessada?- Quais são os valores numéricos envolvidos e quais são os valores usados como comparação?- Todos os elos da cadeia de argumentação funcionam ou apenas um deles?- Foi escolhida a explicação mais simples?- A hipótese pode ter sido falseada e provas podem ser obtidas, ou não?- Quais foram as formas usadas para controlar a veracidade das provas?- As variáveis foram separadas ou colocadas como sendo uma coisa só?- Foi avaliado por uma comissão independente ou por parte interessada?
Além disso, as pessoas usam as seguintes falácias para mentir...- Está se atacando o argumento ou no argumentador?- É argumento com provas ou apenas imposto por alguma autoridade?- A conseqüência apontada provém da causa?- A verdade que se está tentando provar é argumentada com sua negação? (Ex. Ninguém provou que fantasmas não existem, LOGO fantasmas existem...!)- Está se alegando a ignorância alheia? (É você que não entende, LOGO estou certo...!)- A resposta é um fato ou é suposta?- Estão sendo apontados apenas os sucessos e circunstâncias favoráveis ou também os fracassos?- Foi usada uma estatística ampla, ou apenas números pequenos ou grupos escolhidos?- A estatística foi interpretada corretamente?- A argumentação é coerente? Os defeitos do adversário não podem também serem atribuídos ao outro lado? E as qualidades?- O motivo apontado vai levar ao resultado esperado?- A causa tem relação com a conseqüência ou os fatos apenas acontecerem um após o outro?- A pergunta tem sentido ou é totalmente absurda?- Estão sendo apenas os exemplos extremos ou foi também considerado o meio-termo?- Está-se preocupando apenas a curto prazo, ou apenas a longo prazo, ou se está vendo a situação como um todo?- Está se tentando ampliar um fato específico para uma situação ampla?- A exposição está tentando ridicularizar ou tirar elementos importantes do argumento inicial?- Alguma evidência foi suprimida?- Estão sendo usadas as expressões corretas ou eufemismos?
Compilado do livro “O Mundo Assombrado pelos Demônios”, de Carl Sagan

quinta-feira, 13 de setembro de 2007

Histórias de Bizarras nº 3


No ano de 2005, fui fazer um trabalho por três meses em São Paulo e durante esse período fiquei hospedado em um hotel no bairro da Consolação. Em alguns fins-de-semana eu ia para minha casa em Curitiba e outros, minha esposa vinha me visitar. Como ela sofria de enxaqueca severa, o médico prescreveu uma dieta alimentar e também medicamentos. No meio da noite, ela me acordou apavorada, dizendo que havia um homem com uma lanterna no quarto do hotel em que estávamos, mas na verdade nada havia por ali. Pelo período de mais ou menos um mês, até quando ela trocou de médico e este prescreveu novo medicamento, ela viu pessoas passando pelo quarto no meio da noite e essas alucinações aconteciam também na nossa casa em Curitiba. Cada noite era uma pessoa diferente, em uma situação diferente. A ver:
- menina olhando por uma janela e sorrindo;
- homem com uniforme militar ou policial com expressão séria, em uma imagem em preto e branco;
- mulher magra e morena que se sentou no criado-mudo;
- homem de branco, como se fosse um médico;
- mulher gorda morena lavando roupas;
- homem gordo com uma camisa azul de riscas e uma lanterninha de pilhas - esta foi a única cena noturna, em todas as outras parecia ser dia.
Não faziam nada e nem falavam, apenas ficavam olhando. Às vezes apareciam com movimento e outras como em uma fotografia.
As últimas aparições foram as piores. Em uma noite, ela sentiu uma mulher de cabelos negros se sentar ao seu lado na cama. Minha esposa se cobriu com as cobertas, mas a aparição a descobriu parcialmente. Na noite seguinte, começou de onde tinha parado: ela se cobriu com o cobertor, mas sentiu a aparição agarrar o seu pescoço e tentar estrangular. Felizmente tudo passou quando ela mudou o remédio. O médico contou que, apesar de já ter tido pacientes que viam vultos com aquele remédio, nunca havia escutado sobre alucinações tão detalhadas como estas.
Quando meu pai fez uma cirurgia, presenciei alucinações deste tipo, provavelmente ocasionadas por medicamentos: em uma noite que o acompanhei no hospital, ele conversava normalmente, mas lá pelas tantas, olhou para o meu lado e perguntou: “Luiz, quem é esse menino ao teu lado?”. Como não havia ninguém no quarto e como ele não costumava fazer esse tipo de brincadeiras, contestei-o, mas ele insistiu, “Tem sim, um menino com um casaco azul.”
Depois que teve alta, ele dava risadas das alucinações e dizia que também via cavalos passando no alto da parede, como em um filme.

Um dos detalhes interessantes no primeiro relato é que já li outras histórias de fantasmas na Internet em que as pessoas relatavam que viram aparições em preto e branco. Não é um caso isolado.

O sul da Flórida é especialmente rico em narrativas fantásticas. Bem na pontinha sul dos Estados Unidos, 90 milhas náuticas de Cuba, tem uma cidade histórica chamada Key West. Os turistas que resolverem dormir por lá podem fazer um tour noturno passando em frente aos prédios mal-assombrados da cidade. Dizem que fantasmas são vistos até na casa que foi de Hernest Hemmingway.
Fort Lauderdale, 40 minutos de carro para o norte de Miami, fica em um dos vértices do famoso Triângulo das Bermudas. Eu nunca vi desaparecer um navio, mas presenciei algumas coisas estranhas por lá.
Fui avaliar uma casa linda, geminada, porém enorme, com piscina, garagem ampla, etc. O corretor de imóveis havia deixado a chave em um cofrinho com combinação pendurado na maçaneta. Enquanto estava tomando medições senti a sensação de arrepio na base do crânio que por experiência já havia se tornado familiar. Quando eu me aproximava da garagem, a sensação aumentava e quando me afastava, diminuía. Era só uma sensação, mas alguém morreu naquela garagem, eu sei. Eu senti. Quando voltei para o escritório, comentei a sensação com meu patrão e amigo e ele me falou que o corretor havia falado para ele que não gostava de entrar naquela casa.

O que me espanta é que muitas dessas histórias são confirmadas por mais de uma pessoa. Não é uma sensação individual. Por alguns meses trabalhei em uma loja na praia de Deerfield, perto da elegante cidade de Boca Raton. O estoque da loja ficava no sótão e quando o movimento estava fraco, eu subia para arrumar a bagunça. Só havia uma porta, mas em duas ocasiões, eu vi um vulto passando no fundo da sala. Um dia resolvi comentar com o proprietário e ele me disse que antes de ser loja, ali era um bar e que um homem foi assassinado nesse bar. Além disso, algum tempo atrás a sua irmã olhou em um espelho e viu uma pessoa atrás dela. Quando se virou, não havia ninguém.
Em outra ocasião, eu dividia o aluguel do apartamento com A., uma amiga de Goiânia, que trabalhava de dia como baby-sitter e à noite, entregava jornais. Como ela não podia falhar nem uma noite, quando ela queria descansar um pouco, pedia para os amigos cumprir a sua rota de entregas. Ela tinha uma picape e algumas vezes, eu acordava as duas da manhã, pegava o carro, enchia a carroceria de jornais e ia distribuindo pelos condomínios. Para ganhar tempo, jogavam-se os jornais na frente dos apartamentos, mas tinha um em especial em que o assinante era deficiente físico e não conseguia se abaixar. Por isso, tinha-se que caminhar todo o corredor, fazer um furo no saquinho plástico e pendurar o jornal na maçaneta. Em uma bela madrugada, levei um susto, quando entrei distraído no corredor, pois num relance vejo uma pessoa alta em pé em frente ao apartamento e senti a familiar sensação de arrepio da pele. Quando fixei a minha visão, não havia ninguém ali. Com uma sensação desagradável, cumpri a minha missão e pendurei o jornal na maçaneta.
O nosso apartamento estava sempre cheio de brasileiros que moravam no mesmo prédio. No dia seguinte, pela manhã, estávamos conversando em grupo e eu comentei este acontecimento com uma amiga que de vez em quando também substituía A. na entrega de jornais. Ela comentou que no mesmo corredor sempre tinha a sensação de que alguém estava caminhando atrás dela.
Nas vezes seguintes que realizei aquele trabalho, observei de como me sentia estranho naquele andar e tranqüilo nos outros pisos. Apesar de nunca mais ter visto ninguém, havia ali algo de diferente.

Uma vez li um relato na Internet que daria um bom filme de terror cômico. Era de um cara que desde criança via uma entidade não-humana se aproximar dele na cama, o que o deixava apavorado. À medida que foi crescendo, as aparições se tornaram menos freqüentes e menos intensas, mas mesmo assim o incomodavam. Cansado daquilo, resolveu procurar ajuda e uma amiga aconselhou a não fugir e enfrentar o medo, pois esta seria uma alma procurando por alguma ajuda. E assim ele o fez. Só que quando ele começou a chamar o fantasma, este se tornou mais forte de novo. E o pior, trouxe os amigos! Portanto, conforme esse autor, nunca se deve chamar um fantasma, é uma idéia bem insana.

Minha tia N. era professora em uma escola de Porto Alegre e muito amiga de um outro professor. Sempre brincavam um com o outro de que quando um deles morresse, viria puxar o pé do outro. Uma noite, minha tia estava dormindo e sentiu alguém agarrar o seu tornozelo. Ela acordou e perguntou para o marido por que havia feito aquilo, mas ele estava dormindo, não sabia do que ela estava falando. No dia seguinte, soube que o amigo havia morrido.

Outra: morreu o ex-marido de W. Ela estava dormindo com o atual esposo quando este começou a chamar o seu nome com um som gutural: W.! W.! Ela o acordou e ele relatou que havia sonhado com o ex dela, a noite toda. Nisso, ouviram-se batidas fortes na porta do quarto. Os filhos do casal dormiam nos outros quartos da casa e não havia mais ninguém por lá.

quarta-feira, 12 de setembro de 2007

Segurança Aérea 3

Na semana passada, recebemos aqui em casa a visita de nosso amigo Vinícius, que é comissário de bordo há uns 20 anos. Não pude perder a oportunidade de ouvir umas histórias novas...
Um comandante bastante cansado do vôo, não conseguia dormir no seu pernoite em Buenos Aires, pois em baixo da janela do quarto de hotel havia um jornaleiro anunciando: “Clarin! Clarin! Clarin!...”
Lá pelas tantas, ele se irritou, desceu à rua e, para silenciar o rapaz, perguntou quantos Clarins ele tinha: “Dame todos!”, falou, e subiu de volta para o quarto com aquela pilha de jornais. Assim que apagou a luz e encostou a cabeça no travesseiro, ouviu o mesmo jornaleiro: “La Nación! La Nación!...”
Um comissário de bordo bastante efeminado se apresentou ao comandante na cabine de um 747, informando que estaria trabalhando no mesmo vôo. O comandante, de forma grosseira, anunciou aos outros pilotos: “Senhores, temos um viado à bordo!”. E o comissário, sem se deixar abater: “Então somos dois, comandante, porque eu também sou!”
Esse comissário, já falecido, ficou famoso por suas tiradas rápidas. Uma vez subiu à bordo uma famosa atriz, com quem ele já havia brigado em uma ocasião anterior. Antes da decolagem, não o reconhecendo, ela chamou e pediu:
“Por favor, eu queria pedir para não ser importunada.”
“Como, minha senhora?” – Respondeu ele. “Quem está importunando?”
“Ninguém está me importunando. Estou falando isso porque eu não quero que aconteça!”
“Sim, mas quem haveria de lhe importunar?”
“Ora, o público!”
“Mas que público? Isso é um avião, não estamos num cinema ou num teatro!”
Daí, ela se irritou.
“Você não está me reconhecendo? Eu sou a Fulana, atriz da Emissora Tal!”
“Prazer. Sou o Ciclano, comissário da Empresa Tal...”
E tinha também um comandante que, para não comprometer ninguém, vamos dizer que se chamasse Chapolin. Em uma escala, ele chamou o comissário:
“Escute. Você está anunciando meu nome errado aos passageiros, não é Chapolin, pois meu nome é francês, é Chapolã. Entendeu? Chapolã!”
“Sim.” – Respondeu o comissário. “Perfeitamente, comandante.”
“E outra coisa. “ – Continuou o comandante. “Qual sobremesa subiu à bordo na última escala?”
“Pudã.”

terça-feira, 11 de setembro de 2007

Considerações Sobre o Personagem

Aqui está algo que pode ajudar autores e atores: uma “check-list”, ou um “template” com perguntas que devem ser feitas para melhor compreender e/ou inventar o personagem que está sendo criado. As respostas e obediência a essas respostas trazem uma das duas coisas que são de mais valiosas na qualidade de uma obra de ficção, a verossimilhança (a outra coisa é a existência de progresso na ação, ou seja, se não é chata).
1 Dados Gerais:
- Nome, idade, nacionalidade, classe social, época da ação;
- Descreva a aparência física;
- Como ele/ela se vestiria?
- Tem um ritmo rápido ou lento?
- Contínuo ou descontínuo?
- E psicologicamente, como se parece?
2 Mundo Arquetípico – Encaixe o personagem em um padrão.
2.1 Masculino:
- Homem de força (Tarzan, Rambo...);
- Homem de Ação (Hemmingway, Amyr Klink...);
- Homem Romântico (Vinícius de Morais, Cirano de Bergerac...);
- Homem de voz (Hitler, Churchill...);
- Homem Místico (Gandhi...).
2.2 Feminino:
- Mulher primitiva (bruxa, caipira...);
- Mulher bela (Vênus de Boticelli...);
- Mulher sentimental (Roxanne...);
- Mulher sábia e altiva (Mona Lisa...).
2.3 É uma pessoa ativa ou passiva?
2.4 Qual das seguintes palavras que melhor o define: ação, trabalho, intelecto ou sentimento?
3 Associações:
- Lembra alguma metáfora, sátira ou deboche?
- Uma falha... uma fraqueza.
- Tem alguma incoerência: fala-ação, fala-movimento, fala-pensamento, pensamento-ação, pensamento-movimento, movimento-ação...?
- Um elemento escatológico: solta pum? Tira tatu? Cospe?
- Qual pessoa conhecida, o personagem lembra?
- Qual animal?
- Qual objeto?
- Um pecado mortal? (lembrando: ira, luxúria, cobiça, preguiça, gula, inveja ou orgulho).
- O que fazia antes de aparecer para nós? O que fará depois?
4 Adjetivos:
- Liste as suas qualidades;
- Liste os seus defeitos;
- Escolha um desses adjetivos acima que melhor defina o personagem.
5 Corpo:
- Imaginando que ao nos movimentarmos, somos puxados por uma corda imaginária, por qual parte do corpo esse personagem é puxado?
- Onde está o eixo de equilíbrio deste personagem?
- Tem algum plano de movimento predominante?
- Como é a sua postura?
- Sente alguma dor?
- Sente frio ou calor?
- Tem algum defeito físico?
- Tique nervoso?
- Como estão: estômago, músculos, transpiração, coração e respiração?
6 Partes do Corpo:
- Pés: como ele pisa?
- Boca: posição da língua e das mandíbulas.
- Olhar: direto, penetrante, vago, de soslaio. Como pisca?
7 Fala:
- Lembra que voz? Desenho animado, ator, pessoa conhecida?
- Lembra o som de que animal?
- Tem um defeito ou característica de fala? Gagueira, sotaque, tatibitate, fanho, língua grudada, voz estridente, rouca, chorosa, tosse, espirro, voz aspirada, engasgada, suave, monótona, voz de robô, acelerada, disco em rotação lenta?
8 Pensamento:
- Descreva o pensamento do personagem;
- Idem, em uma só palavra;
- Gosta da sua aparência?
- O que o: acalma? Amedronta? Intranqüiliza? Dá prazer?
- O que o personagem pensaria sobre você ator/autor?
- Quais são os seus objetivos?
- Quais são os seus conflitos: interiores? Com os demais personagens?
- Passeie pela rua pensando e enxergando como o personagem.

No final, confira as suas respostas com aquela linha que você vinha trabalhando e verifique se o personagem ficou ou não ficou muito mais próximo da realidade...Bom proveito!


segunda-feira, 10 de setembro de 2007

Futuro do Pretérito

É impressão minha, ou esta semana está uma modorra jornalística? Nada acontece, o Brasil parece estar em suspensão. Sem acidentes, novos escândalos ou crimes ainda mais bárbaros. Não que eu esteja agourando, querendo que o país volte a sua rotina normal, não, longe de mim, mas que está estranho, está.
Na falta de fatos novos, vou falar no futuro do pretérito. O que o governo poderia ter sido?
Posto que não creio que o Brasil vá virar um país de mentalidade liberal no próximo século e nem creio que vá virar uma Cuba. Nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Na verdade, acho que vai continuar assim como já estamos acostumados, 90% da população pagando impostos para os 10% dos funcionários públicos desfrutarem. Acho que os nossos governantes não seriam burros ao ponto de implantar o comunismo no Brasil, pois seria mau negócio: se tudo fosse estatizado, quem iria pagar a conta da roubalheira? Continuarão as migrações no nordeste. Continuarão os níveis de analfabetismo e as filas no INSS. Continuará o assistencialismo. O que quero falar aqui são das pequenas promessas de Lula que teriam me surpreendido.
Lula falou que iria discutir o aborto. Como os padres começaram a chiar, ele resolveu ficar bem quietinho. O momento passou, teria que ter sido feito no início do seu governo, mas não teve coragem. O ministério da saúde falou que iria priorizar as cirurgias de vasectomia pelo SUS, mais simples e baratas do que a ligadura de trompas. Estamos ainda esperando. Controlar o crescimento da população teria sido uma boa idéia, mas em um governo de promessas, ficamos apenas no futuro do pretérito.
Lula falou a vida toda na reforma política. Agora que teria podido, não o fez.
Prometeu-se mega-obras de infra-estrutura. Nunca se arrecadou tanto imposto e nem as reservas monetárias brasileiras foram tão altas, mas as estradas, portos e aeroportos estão no caos que todos sabem. Poderia ter sido feito, mas não foi.
A qualidade de ensino poderia ter sido escolhida sobre a quantidade de alunos matriculados. Atingimos 97% de alunos matriculados, mas 50% não aprendem. O ensino fundamental poderia ter sido privilegiado em lugar das universidades, mas não foi. Para o nosso governo, é mais importante um doutor defendendo a tese da “Importância da Buchada de Bode na Economia do Nordeste” do que um menino saber que Tiradentes se revoltou heroicamente contra os impostos do governo. Claro, isso não interessa aos nossos governantes, mas poderia ter interessado a nós, o povo, se quiséssemos um país melhor.
Assim, nessa semana em que creio mais se parecer ao silêncio que procede às tormentas do que ao suspense que precede as batalhas (que batalha, se tudo continuará como sempre foi?), o tempo presente me faz pensar nas oportunidades que estamos desperdiçando. É uma pena estarmos participando de mais um capítulo da história do Brasil que está ficando apenas naquilo que poderia ter sido.



domingo, 9 de setembro de 2007

Minha Vida Minha

Você entrou na minha vida
E me falou que a sua vida é minha,
Mas logo percebi que a minha
Também a você pertencia.
A toda hora,
Fora de hora,
Agora e de manhazinha,
Quando eu quis abrir minhas asinhas
Você mostrou porque vinha
E logo cortou minhas peninhas,
Dizendo que era sua a vida minha.
Certas vezes eu fiquei na minha
Enquanto entrar na sua era o que convinha,
Mas como nunca soube se era sua ou se era minha
Ou qual a vida que eu tinha,
Perguntei a você, ó vida minha,
E você falou que a sua vida é minha
E que era sua a vida minha.

sexta-feira, 7 de setembro de 2007

Mais Histórias de Aviação.


Devido ao sucesso entre os amigos que fez o texto sobre os meus tempos de piloto que pode ser lido clicando aqui, aqui está o Segurança Aérea II – O Retorno.
Os prefixos dos aviões brasileiros são designados por três letras, antecedidas de PP, para aeronaves públicas e PT, para as privadas. Assim, os aviões recebem apelidos dos mais diversos, como o GSW (Gersow), o NSD (o Nérso), o HOV, que tinha pintura verde e por isso se chamava HO Verde e assim por diante. Depois que quebrei o trem de pouso no incidente que eu relatei na postagem anterior, o HBK passou a ser chamado mui carinhosamente de “Hoje o Bonow Kai”.
O Aeroclube do Rio Grande do Sul tinha na década de oitenta um planador emprestado do antigo Dep. de Aviação Civil, o PP-PAU. Pela manhã, quem ia chegando no aeroclube, tinha que ajudar a empurrar os aviões para fora do hangar e, juro que já ouvi um aluno gritando pro outro: “Ô, Fulano! Vem aqui me ajudar a tirar o PAU prá fora!”.
Quando um motor pára em vôo, a expressão a ser usada é de “perda” do motor. Conta-se que um dia um co-piloto falou para o comandante:
- Comandante, perdemos a turbina 2!
- Afirmativo. Tente novamente acionar!
- Comandante, o senhor não entendeu: PERDEMOS a turbina 2!
A turbina havia caído no mar...
E tem também o diálogo daquele comandante experiente, para o co-piloto novato, pousando em Foz do Iguaçu:
Comandante: “- Já viu a catarata?”
Co-piloto (olhando prá fora): “- Onde? Onde?”
Comandante (abrindo o olho com as mãos): “- Aqui, ó!”
Lembra daquele cara que soltava uma galinha pela janela? Pois é, pelo que eu sei, voava DC-3, nos tempos da aviação heróica. Naquela época, cada aeroporto tinha um cachorro como mascote. Uma das diversões dele era roubar os cachorros e largar em outros aeroportos... Certa vez, tinha um passageiro freqüente, um matuto, que queria porque queria pilotar o avião. Um dia ele amarrou duas cordinhas e passou por baixo da porta da cabine com a seguinte recomendação: “Pronto, agora você pilota o avião, com esta corda sobe e com esta desce.” e, enquanto lá dentro, o co-piloto sacudia o avião de todas as maneiras, o capiau desesperado, sentado no meio do corredor, lutava com as cordinhas para controlar a possante aeronave!
Esta, foi-me contada por um mecânico da FAB: eles estavam pousados com um Avro na Amazônia, carregando caixas de cobras vivas para o Instituto Butantã nos fundos da cabine de passageiros. Quando ele voltou com mais uma caixa, havia uma passageira grávida, encostada nas cobras. Ele, com jeito, tirou a senhora dali e a conduziu para o assento. A senhora então perguntou por que não poderia ficar por ali e ele disse a verdade sobre as cobras. Daí, a senhora desmaiou...
Mais uma de grávida: peguei um avião do Rio para Florianópolis e sentei naquele banco da frente, de cara com a parede da cabine, no assento do meio com um cara sentado no corredor e uma senhora grávida na janela, a minha direita. Na escala em Curitiba, não tinha teto e o avião ficou um tempão voando em “órbita”. Comecei a conversar com o cara e descobri que ele era mecânico de aviação. Conversa vai, conversa vem, lá pelas tantas, começamos a conversar sobre acidentes aéreos: “- Lembra daquele VARIG, na África?” “- E daquele Transbrasil em Florianópolis...?”. E o nosso avião só sobrevoando o Paraná, no meio das nuvens... Lá pelas tantas, olho para o lado e a mulher grávida estava grudada na cadeira, segurando os dois braços da poltrona firmemente, com os pés na parede em frente, dedos dos pés fendidos e olhos esbugalhados... Achamos melhor mudar de conversa.
E naquela reunião de pilotos em que eu estava, todos já meio bêbados naquela altura da noite em que alguém inventou de tocar o disco com o Hino do Aviador que diz: “Contato, companheiro/ Ao vento sobranceiro...”. “- O que que é vento sobranceiro?”, pergunta um. “- É que quando liga a hélice vem aquele vento nas sobrancelhas...”, responde o outro.

Na aviação, noite é considerada a partir do minuto em que o sol se põe, tem um horário fixo, a partir do qual quem estiver em operação diurna corre o risco de levar multa, mesmo que pouse com visibilidade no lusco-fusco do dia. Por isso, quando o congestionado Campo de Marte, de São Paulo, operava só visualmente e diurno, conta-se que volta e meia se ouvia pelo rádio algum piloto pedindo para o controlador: “- Torre Marte, aqui é o PT- qualquer coisa. Devido a um vento de proa, solicito atraso no horário do pôr-do-sol...”

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

Cê não tá intendendu, ô meu!


Cê não tá intendendu, ô meu!
Não é que o governo seja incompetente, corrupto, ou faltem verbas e pessoal para acabar com os incêndios florestais. Os pesquisadores estão lá, vendo o fogo por satélite, sabem a localização exata, latitude e longitude de GPS, bastaria imprimir a foto e mandar multa pelo correio para o fazendeiro, como se faz com as de trânsito. As queimadas das propriedades acabariam em seis meses e o nosso amado país deixaria de ser um dos maiores emissores de CO2 do planeta.
Não é esse o problema, a questão é que existe um plano metódico por parte do nosso governo para aumentar as áreas de agricultura, para poder faturar mais, mesmo em detrimento do meio-ambiente.
Ce não tá indendendu, ô meu!
Não é que faltem verbas para o SUS. As deste ano foram de 37 bilhões e a do próximo serão de 45. Quarenta-e-cinco Bi! Se somarmos a isso outras verbas do ministério e os demais investimentos em previdências dos funcionários públicos, por uma conta simples chegaremos à conclusão que daria para pagar um plano particular de, no mínimo dos mínimos, uns 30 reais mensais para cada brasileiro. Nesse montante de capital, nessa escala de economia, qualquer plano de saúde privado toparia dar um tratamento de primeira para toda a população por esse valor.
O problema não é o de faltar verbas, mas o de um monte de gente mamando, um monte de recursos a serem desviados, um poder político enorme que é gerado pela doença e pela miséria.
Cê não tá intendendu, ô meu!
Não é que se sonegue impostos nesse país. Bastaria implantar o imposto único, pago pelo consumidor final, como acontece em muitos países.
Só que daí o governo teria que declarar exatamente quanto arrecada, a burocracia iria diminuir, dispensando um monte de gente que mama dela e ficaria difícil de cobrar mais de 40% de cada produto vendido.
Cê não tá intendendu, ô meu!
O número único de identificação, que nasce e morre com o indivíduo, como acontece nos Estados Unidos, Uruguai e Argentina já é lei, de 1997, de Pedro Simon, só que nunca foi regulamentada. Se acabarmos com um monte de documentos inúteis, como o governo vai justificar a sua burocracia? E como alguém vai poder fazer um monte de falcatruas sem ficar com o nome sujo pelo resto da vida?
A criminalidade não é acaso, é planejamento.
Cê não tá intendendu, ô meu!
O imposto de importação de uns 100% não é para proteger as empresas brasileiras contra concorrência estrangeira. O imposto serve para incentivar o contrabando e gerar subornos nas fronteiras, portos e aeroportos, subornos estes que patrocinam campanhas políticas pelo Brasil afora. No Chile e Estados Unidos, esse imposto é baixíssimo e nem por isso deixam de ser países prósperos.
Por isso, ô meu, vê se dobra a língua ao dizer que nada funciona no Brasil. Funciona, sim, é um país extremamente eficiente. Só que funciona para quem se beneficia das falcatruas dos nossos sucessivos governos.
Intende?

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

Sonho de 31/02/1989

Eu havia ido a um jogo de futebol, um grenal. Fui dar uma olhada nas arquibancadas e elas estavam muito cheias. Fui comprar entrada. Grupos de pessoas chegavam ao saguão do estádio com botes infláveis, pois havia um canal neste saguão que levava ao campo e elas poderiam assistir ao jogo flutuando. Falei com o cambista, as cadeiras cativas custavam três vezes o preço da bilheteria. Fui caminhar pelo estádio. Havia uma máquina, uma espécie de escada rolante para se limpar os sapatos, porém realizava um movimento de vaivém muito rápido e seria perigoso subir nela para tal fim. Uma mãe puxa o seu filho para evitar que ele faça isso, enquanto eu observo a máquina.
Caminho pelo estádio e este parece um teatro do século passado, as cadeiras cativas ficavam em camarotes e próximo ao corredor onde ficavam os camarotes havia um saguão ricamente decorado.

terça-feira, 4 de setembro de 2007

Histórias Bizarras (2)


Fiquei craque em reconhecer o tipo de casa mal-assombrado na época em que trabalhei como auxiliar de um avaliador de imóveis no sul do estado da Flórida. No período de um ano, devo ter fotografado a fachada de umas mil casas e entrado em pelo menos umas trezentas, fazendo também medições e croquis. Visitava desde apartamentos de 1,5 milhão de dólares, até cortiços dos bairros pobres de Miami. Com esta minha larga experiência em visitar imóveis, posso arriscar um palpite: uns dois, três por cento têm alguma coisa de estranho.
Fui visitar uma casa que estavam por vender em Miami. Como eu não tinha a chave, pulei a cerca de madeira e fiz medições externas, fotografando também alguns cômodos por fora das janelas. Era uma casa bonita, de esquina, com piscina, bem típica da região. Sentei-me na varanda para rabiscar melhor a planta-baixa. Quando estou concentrado fazendo isso, levo um susto: a veneziana bateu com violência, como se alguém tivesse dado um chute. “O vento”, pensei na hora. Em menos de meio minuto, comecei a ouvir um choro de bebê vindo de dentro da casa abandonada. Novamente tentando racionalizar, pensei comigo mesmo “é no vizinho”. Saí pelo portãozinho, virei a esquina e fui olhar a casa ao lado. Estava para alugar! Vazia também. O que eu fiz? Peguei o meu material de trabalho, entrei no carro e fui terminar o croqui uma quadra adiante... Ficar lá sozinho? Nem a pau!

Nos filmes de fantasmas, as pessoas ficam com frio quando estão perto das entidades, mas não é assim que acontece, a sensação é diferente, na verdade são os cabelos da nuca que vão ficando arrepiados, junto com os pêlos do antebraço e da parte de trás das pernas. É uma sensação de pele, mas não de frio. Por outro lado, como nos filmes, casas mal-assombradas são casas bonitas e decadentes. Isso é verdade, em via de regra, ainda que existam exceções.

A literatura sobre assombrações (sim, existe literatura sobre o assunto!) fala que elas aparecem em três tipos distintos: seres humanos, seres não-humanos e reconstituições históricas. Os seres não-humanos são aquelas criaturas que parecem saídas dos filmes do Harry Potter, pequenos demônios e outros seres assustadores.
Muitas pessoas relatam que viram cenas antigas passando diante dos seus olhos, uma batalha, por exemplo, como se fosse a reprodução de um vídeo. No entanto, o mais comum, e o primeiro que pensamos quando falamos em fantasmas, parecem ser as entidades com aparência humana.
Os estudiosos também nos informam dos locais mais comuns de se encontrarem assombrações: teatros, hospitais, cemitérios hotéis e escolas. Na Internet, existem webcams em locais famosos por seus fantasmas, muitas dessas páginas possuem galerias de fotos bem aterradoras.

B., Um amigo carioca que morava na Flórida conseguiu um emprego maravilhoso, vigia noturno de uma escola. Como o nível de violência e vandalismo por lá é muito baixo, o trabalho dele consistia em pegar um carrinho de golfe e de vez em quando fazer rondas pelo terreno. Emprego ideal para o adolescente que ele era na época. Uma bela noite ele convenceu um outro amigo a se divertir com ele: ficaram contando piadas, pegavam o carrinho, manobravam perigosamente pelas ruas desertas e assim por diante. Lá pelas tantas da madrugada, viram um arbusto se mexer. Os dois estavam absolutamente sozinhos na escola, mas quando começaram a se aproximar ouviram um bando de crianças gargalhar. O visitante olhou para o vigia e disse: “Meu amigo, vou para minha casa dormir...” e ambos saíram correndo. No dia seguinte, B. pediu demissão. Eu conheci os dois protagonistas do evento e ambos me contaram a mesma história, com todos os detalhes e em ocasiões diferentes, de modo que me pareceu um relato verdadeiro.

Cotejando ainda a teoria de os hotéis serem locais sinistros, presenciei um fato interessante quando trabalhava como recepcionista noturno em um hotel na cidade de Fort Lauderdale. Estava trabalhando sozinho quando um hóspede chegou até a recepção e disse que queria mudar do quarto 114. Perguntei qual era o problema e ele falou da maneira mais séria do mundo: “- É que aquele quarto está amaldiçoado!”. Tive de me segurar para não rir, mas como eu tinha uma certa prática em lidar com hóspedes malucos e como o hotel estava lotado, convenci-o a ficar por ali mesmo.
Uns 10 dias depois, chegou um outro hóspede na recepção e me falou que estava no quarto 114 e que queria mudar de quarto. “- Por quê?”, perguntei. “Porque tem um poltergeist por lá!”. Desta vez, não achei engraçado, simplesmente dei a chave de um outro quarto.
Interessante, não? Dois hóspedes que não se conheciam fizeram reclamações similares e totalmente amalucadas sobre o mesmo quarto. E não parou por aí!
O 114 ficava ao lado da salinha de “break” dos funcionários, onde tinha uma mesa e uma pequena cozinha. Normalmente eu levava um lanche para esquentar no microondas. Algumas semanas depois desses relatos acima, o rapaz da manutenção pegou uma TV de um dos quartos que estava sendo reformado e colocou naquela salinha. De repente, quando estava ajeitando a minha janta, a TV ligou sozinha! E isso, para o meu terror, se repetiu vários dias seguidos. Dá para imaginar? Eu era o único empregado do hotel naquele horário, entrei em uma cozinha e de repente a TV começou a funcionar sem qualquer comando da minha parte. O fenômeno só parou depois de vários dias, quando fechei o buraco do sensor do controle remoto com papel, o que afastou a possibilidade de maus espíritos. Imagino que era ação das lâmpadas fluorescentes da sala que interferiam com o controle, mas que assustou bastante, ah, isso sim assustou. Serviu, no entanto, para que eu conhecesse um pouco mais de mim mesmo: eu prefiro enfrentar fantasmas a ficar sem jantar!

Leia também Histórias Bizarras (1),
clicando aqui.

segunda-feira, 3 de setembro de 2007

Carros Versus Ônibus


Vou escrever uma coisa que ninguém, mas ninguém mesmo, concorda comigo, mas nem por isso, deixo de acreditar que seja verdade: transporte coletivo é anti-democrático!
Em primeiro lugar o argumento mais grosseiro: apenas um imbecil defende a idéia de que andar de ônibus é melhor do que andar de carro. Ponto final. Se andar de ônibus fosse bom, os senhores vereadores que aprovam leis, andariam de ônibus, mas não, eles andam de automóvel. Se metrô fosse bom, os juízes do supremo, o ministro dos transportes e os nossos embaixadores de carreira, andariam de metrô, mas não. Eles andam de carro. Só por isso, já podemos perceber que existe alguma coisa errada na idéia de defender que uma parcela da população viaje espremida e outros poucos privilegiados trafeguem ouvindo música e sob ar-condicionado. Os que defendem o ônibus, o defendem só para os outros, para eles próprios, não.
Adianta o metrô para a população pobre? Como, se o simples ato de divulgar o projeto, já cria uma especulação imobiliária em volta da área que expulsa para bem longe todos os pobres que seriam beneficiados?
É óbvio, além do conforto do carro, existe a liberdade de rotas e horários. Menos doenças contagiosas. Menos perda de tempo. Menos risco de furtos. Menos dependência de funcionários que podem entrar em greve. Menos frio, calor e chuva. Mais possibilidade de carregar objetos e crianças. Menos caminhadas nas conexões...
Existe ainda a questão de logística para o país. O transporte privado é como uma espécie de Internet viária: não pode ser detido, pois está distribuído em infindos usuários. Não seria qualquer grevezinha que pararia a cidade. Os impostos não precisariam ser drenados em um custo que deveria ser individual. As seguranças econômica e de infraestrutura seriam muito maiores para o país.
Ora, direis, “mas as cidades já estão no limite de tráfego, como então fazer?”. Bem, Curitiba é a capital brasileira com mais carros per capita, chegando perto de um por habitante. Em primeiro lugar, é justamente uma das cidades brasileiras onde o tráfego melhor flui, colocando por terra o argumento de que o problema é o número de automóveis. O problema é falta de investimentos em vias e falta de viadutos, revisões de tráfego, estacionamentos, coordenação de semáforos, educação no trânsito, etc. Só para comparar, no sul da Flórida, local onde existem mais de dois carros por habitante, ou seja, quase três vezes mais do que na cidade brasileira mais motorizada, os engarrafamentos não são maiores do que por aqui. E olhe que por lá o trânsito é formado por gigantescos Hummeres e Cadillacs.
Uma vez, li no Janer Cristaldo (link ao lado) que essa é a diferença do pensamento americano para o do latino. Quando um latino vê alguém dirigindo um carrão, ele pensa: “preciso fazer algo para que esse privilegiado também caminhe, como eu!”, mas quando um americano vê alguém com um carrão, ele pensa: “preciso pensar em algo para que todos possam ter um carrão também!”.
Esse é o cerne da questão. Quando um político se vangloria que melhorou o transporte público, ele está simplesmente sendo um cínico, um canalha classista. Ele não quer o melhor para todos, mas sim dividir ainda mais a sociedade entre os que têm e os que não têm.
E, falando de Curitiba novamente, veja só que interessante: o atual prefeito daqui privilegiou enormemente o transporte individual. Em três anos, criou vários dos aqui chamados “binários” (vias rápidas de sentido único), reservou grandes áreas de estacionamento nas novas construções, abriu novas ruas em pontos embolados de trânsito, acabou com o estacionamento em uma rua do centro que vivia engarrafada sob protestos dos lojistas... e está com 78% de aprovação do eleitor para o próximo ano.
Será que a imagem de felicidade que a população tem em sua cabeça é mesmo a de andar de ônibus e metrô, como propagam os nossos políticos elitistas ou, como dizia aquela propaganda de carro, precisamos rever os nossos conceitos?

domingo, 2 de setembro de 2007

Ética

No meio desse mar de lama que vemos todos os dias na TV, o presidente teve o cara-durismo de proclamar que nenhum partido é mais ético do que o PT e que os políticos brasileiros não são mais éticos do que ele.
E sabem o que mais me assusta?
É que é verdade!

Medo

Medo.
Medo, medo, medo, medo.
Medo do escuro, de dedo-duro, de dar furo. Medo do futuro.
Medo do pecado, do enfado, do vizinho ao lado, de comer carne de gado. Medo do passado.
Medo de gente, de dor de dente, do que se sente, de acidente, de ser diferente. Medo do presente.
Medo, medo, medo.
Aranhas subindo pela parede.
Monstros sob a cama.
Fantasmas à espreita no corredor.
Longe se foram os dias sem medo, a grama verde dos parques e os dourados anos, agora só restaram as trovoadas na escuridão da madrugada e os latidos dos cães famintos anunciando intrusos.
Vê-se as cores fortes em preto e branco. Vê-se os pastéis em cinza.
No entanto, a luz da lua é vermelha como o sangue.
Medo.
Um medo objetivo e pessoal.
Um medo vivo e visceral,
Nocivo e fundamental.
Um medo sem enredo.
Um medo sem credo.
Um medo que veio na noite fria,
Sem meio e sem periferia,
Sem sexo ou hermafroditismo,
Perplexo diante de um abismo.
Correto e sem brio,
Completo e vazio.
Ali e adiante,
Aqui e distante.
Medo.
Medo, medo, medo, medo. Medo.