quarta-feira, 25 de julho de 2007

Carta a um Jovem Poeta

(com sua benção, Rilke...)
Mário Quintana falava que um poeta que se preze não gosta de ler poesia dos outros. Concordo plenamente, ler poesia é das coisas mais chatas do mundo, no entanto, é onde a arte de escrever se manifesta na sua maior grandeza.
Gostaria de compartilhar o que já aprendi nesse assunto.
Minha definição: poesia é uma longa idéia contida em um curto espaço. Esse curto espaço pode ser um calhamaço, mas se fôssemos colocar a Ilíada em prosa, necessitaríamos uma biblioteca.
Quanto ao tempo, trata-se de um presente eterno, atemporal.
Quanto à pessoa, está sempre na primeira. Fala-se sempre do “eu” (o romance trata do “ele” e o teatro do “tu”).
Quanto ao tema, só existem dois, amor e morte. Todos os outros assuntos não são pertinentes. Eu diria que existe mais um subtema, relacionado a esses dois: deus ou deuses. Veja bem a nuança, religião não é o tema da grande poesia, mas deus, o conflito do ser humano com forças incompreensíveis e maiores do que ele.
Pelo motivo acima, toda a poesia social ou socialista, sem exceção, é uma bosta, poesia religiosa é uma merda e poesia regionalista é cocô no seu estado mais puro.
Quando existe a rima, esta deve ser organizada na razão inversa da obviedade. Exemplifico, quais são os melhores versos: “Eu tenho uma fé/ Que é a de tomar café” ou “Tomar café/ Essa é a minha fé”? A primeira. Café rima com fé, mas fé não combina com café porque é uma palavra mais rara, menos usual, dá a impressão que foi incrustada ali só para enfeitar, vira pedantismo. A regra é a de que a palavra mais óbvia venha sempre depois da mais metida a besta.
Como ler poesia: todo e qualquer bom poema tem um ritmo regular, de metrônomo. O tempo de leitura deve ser estudado com esse aparelho para que se tenha domínio do texto. O próprio autor do texto é o melhor declamador que existe porque ele tem a intuição desse ritmo. Poesia é uma literatura de característica oral, na escrita, ela perde a alma. É por esse motivo que muitos dizem que não gostam de poesia, mas sabem de cor as letras de músicas.
A poesia brasileira não é lá grande coisa porque ficamos quase três séculos sem noções de classicismo. Enquanto o período barroco durou trinta anos em diversos países, por aqui durou duzentos, e depois pulamos direto para os romantismos rousseauísta (estilo Peri e outras bobagens) e schopenauriano (mal-de-siècle, deprê). A mente da moderna poesia brasileira nunca teve um padrão estrutural. A nossa própria maneira de falar é barroca, a ordem na oração não importa. Por esse motivo, tendo maior população nós geramos muitos mais poetas que Portugal, mas o grande totem da nossa língua é o português Fernando Pessoa. Se não leu, jovem poeta, leia, que o cara era bom.
Acho que é isso. O resto é prática.




Nenhum comentário: